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Tirez sur le pianisteChico (Albert Rémy), um pequeno criminoso, é perseguido por um par de gangsters com quem tem negócios, refugiando-se no bar onde o seu irmão toca piano. Este (Charles Aznavour), conhecido como Charlie, é de facto o antigo pianista de concertos clássicos Edouard Saroyan, que através de flashbacks vamos descobrir que deixou a sua vida anterior após o suicídio da esposa (Nicole Berger). Cuidando do irmão mais novo, Fido (Richard Kanayan), Charlie é conhecido pela sua timidez, que o leva a hesitar em conquistar a colega do bar, Léna (Marie Dubois). A chegada de Chico vai colocá-lo na mira dos criminosos, precipitando a sua relação com Léna e consequente fuga.

Análise:

Depois do sucesso em termos críticos de “Os Quatrocentos Golpes” (Les Quatre Cents Coups, 1959), François Truffaut continuou no rumo que marcaria a Nouvelle Vague, com argumentos improvisados, estrutura de filmagens decidida dia a dia, e muita improvisação de diálogos e de planos.

No tema principal continuavam as histórias da rua, de anti-heróis, com um olhar para um submundo urbano, feito de pequenos criminosos, perdedores crónicos, vítimas de más decisões e passados sem resolução, que faziam Truffaut partilhar de um imaginário próximo do seu colega e amigo Jean-Luc Godard, como o espelhado no filme deste, “O Acossado” (A bout de souffle, 1960).

Com um argumento baseado no livro “Down There” de David Goodis, em “Disparem Sobre o Pianista” temos a história de Edouard Saroyan (Charles Aznavour), agora conhecido como Charlie, no bar onde se refugia, como pianista, depois de rejeitar uma vida de concertista em reputadas casas de concerto. Edouard vira a sua vida rumo à fama colidir com o desencontro com a esposa Thérèse (Nicole Berger), que a levaria ao suicídio. Conhecido pela sua timidez, Edouard abandonaria a sua vida anterior, para se esconder de si próprio num barzinho inconsequente, onde nem se arriscava a tentar o romance com a empregada de bar, Léna (Marie Dubois) que nitidamente o desejava.

Os acontecimentos precipitam-se quando Chico (Albert Rémy), um dos seus três irmãos, o procura, fugindo de dois gangsters (Claude Mansard e Daniel Boulanger) por dívidas em pequenos crimes. Edouard ajuda Chico a fugir, passando ele e Léna a ficar na mira dos gangsters, que querem encontrar Chico, e o outro irmão de ambos, Richard (Jean-Jacques Aslanian).

A história torna-se então uma espécie de fuga, intercalada com flashbacks, e com as tentativas de conquista amorosa de Edouard, que culminarão na morte de Plyne (Serge Davri), o patrão de Edouard e Léna, e no rapto de Fido (Richard Kanayan), o pequeno irmão a cargo de Edouard.

Utilizando um baixo orçamento, Truffaut e a sua equipa filmaram nas ruas de Paris, improvisando lugares, cenas e diálogos, conferindo ao filme o seu já habitual aspecto de espontaneidade e imediatismo. Com uma montagem viva, alternando longos planos sequência com rápidos jump cuts, desrespeitando a sequência normal dos acontecimentos, empolando pormenores graças à sua montagem (veja-se o exemplo da hesitação de Charlie em tocar a campainha) e fazendo uso de interpretações cruas e quase intempestivas, Truffaut desenvolve o seu léxico visual para contar uma história humana com iguais graus de distanciamento e de emoção intencional. Era intenção de Truffaut distanciar-se do seu primeiro filme, rodando cenas que valessem por si próprias sem a prisão de uma coerência narrativa que necessariamente as ligasse (veja-se como exemplo a sequência inicial e a conversa que do nada interrompe uma perseguição, a qual parece quase imaginária, ou a forma como os flashbacks cortam a tensão narrativa).

Em Charles Aznavour, Truffaut encontrou o seu anti-herói, por natureza fraco, à mercê das mulheres, e longe do personagem do livro em que se baseou. Explorando as fraquezas e incongruências de Edouard/Charlie, Truffaut pretendia prestar homenagem aos Film Noir americanos de baixo orçamento (não faltando as longas narrações em off), centrando-se mais na psicologia do protagonista que no papel dos gangsters ou dos crimes. A homenagem ao cinema americano é evidente em diversos pormenores. O nome Charlie será um tributo a Chaplin, bem como Chico uma referência a Chico Marx.

Apesar de bem recebido pela crítica, “Disparem Sobre o Pianista” foi um fracasso de bilheteira, obrigando Truffaut a repensar o seu caminho.

Produção:

Título original: Tirez sur le pianiste; Produção: Les Films de la Pléiade; País: França; Ano: 1960; Duração: 81 minutos; Distribuição: Cocinor (França), Gala Film Distributors (Reino Unido); Estreia: 25 de Novembro de 1960 (França).

Equipa técnica:

Realização: François Truffaut; Produção: Pierre Braunberger; Argumento: François Truffaut, Marcel Moussy [adaptado do livro “Down There” de David Goodis; Diálogos: François Truffaut; Música: Georges Delerue; Fotografia: Raoul Coutard [preto e branco]; Montagem: Claudine Bouché, Cécile Decugis; Design de Produção: Jacques Mély [não creditado]; Caracterização: Jacqueline Pipard [não creditado]; Direcção de Produção: Serge Komor.

Elenco:

Charles Aznavour (Charlie Kohler / Edouard Saroyan), Marie Dubois (Léna), Nicole Berger (Thérèse Saroyan), Michèle Mercier (Clarisse), Serge Davri (Plyne), Claude Mansard (Momo), Richard Kanayan (Fido Saroyan), Albert Rémy (Chico Saroyan), Jean-Jacques Aslanian (Richard Saroyan), Daniel Boulanger (Ernest), Claude Heymann (Lars Schmeel), Alex Joffé (Transeunte), Boby Lapointe (O Cantor), Catherine Lutz (Mammy).