New Wave of Hollywood

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Introdução

"Easy Rider" (1969)Tendo crescido nos anos 70 e 80, fui desde logo exposto (principalmente por via da TV), ao cinema que se tornou característico do período que se viria a chamar a “Nova Hollywood”. Trata-se de um período de choque contra os mitos, os heróis, os géneros clássicos, os finais felizes e histórias de moral politicamente correcta. O mundo estava em transformação (segundo alguns a modernizar-se), e isso reflectia-se no cinema.

A preocupação principal dos novos autores de Hollywood, que sentiam agora um poder maior em relação aos estúdios, era mostrarem-nos o conflito de ideias, a irresolução de temas, e o pessimismo que abalava a sociedade. Hollywood era então assaltada por temas nunca antes pensados possíveis, a homossexualidade, a droga, o choque de gerações, a solução violenta, o medo da conspiração, a revolta contra o sistema.

É esse choque que aqui se pretende ilustrar com cerca de duas dezenas de filmes que marcaram o cinema de Hollywood que se fez entre o final dos anos 70 e dos anos 80 do século XX.

O Declínio do Studio System

"Bonnie and Clyde" (1967)Os anos 60 do século XX ficaram marcados em Hollywood como os anos do declínio do chamado “Studio System”, que durava desde os anos 20, e durante o qual os principais estúdios controlavam em absoluto todos os aspectos do cinema, desde a produção (contrato de actores e técnicos, propriedade dos estúdios e equipamentos), distribuição e exibição (detendo verdadeiras cadeias de salas de cinema por todo o país).

Começando no Caso Paramount, os tribunais começaram a ditar leis anti-trust em 1948, legislando contra os monopólios do cinema. Nos anos 60 foi a vez do advento do femómeno televisivo que começou a fazer as pessoas ficar em casa. Os principais estúdios (20th Century-Fox, Metro-Goldwyn-Mayer, Paramount Pictures, RKO Radio Pictures, Warner Bros, Universal Pictures, Columbia Pictures e United Artists) sentiram que algo tinha que mudar.

"Midnight Cowboy" (1969)Como forma de fazer face ao declínio, os estúdios apostaram nas grandes produções com écrã alargado (como o Cinemascope), cores fortes (como a Technicolor), som stéreo e tentativas de 3D. Os musicais e os grandes épicos históricos tornaram-se moda, mas o resultado foi o encarecimento dos filmes sem uma garantia de retorno de público às salas de cinema, o que levou os grandes estúdios a ficar perto da falência.

Em 1969 filmes como “Easy Rider”, de Dennis Hopper e “Midnight Cowboy”, de John Schlesinger, surpreenderam Hollywood pelo sucesso obtido, embora fossem produções menores, entregues a realizadores desconhecidos. De um momento para o outro Hollywood percebeu que o futuro do seu cinema estava na nova geração, e nos temas por ela trazidos, onde pontificavam a contra-cultura dos anos 60, o revisionismo desta decorrente, e as influências do cinema independente e estrangeiro.

A Contra-cultura

<pFestival de Woodstock, 1969A chamada contra-cultura americana dos anos 60 foi a cultura alternativa de uma juventude que cresceu no pós-guerra. Não tendo este artigo pretensões de a descrever em toda a sua complexidade, pode-se no entanto enumerar alguns dos pontos que a definem. Desde logo a música rock, com a explosão da Beatlemania, e todos os movimentos musicais daí decorrentes, que culminariam no famoso Festival de Woodstock em 1969. Ao mesmo tempo desenvolvia-se o movimento hippy e o psicadelismo, com os seus aspectos ligados à revolução sexual, liberdade de expressão, pacifismo, ambientalismo e consumo de drogas.

<pManifestações anti-guerra nos anos 60Com o protesto contra a guerra do Vietname, estes movimentos ganham uma expressão global nos Estados Unidos, unindo toda uma geração e marcando novas ideias e formas de estar. É a época de músicos como Bob Dylan, Joan Baez, John Lennon, Jimi Hendrix e The Doors; de comediantes como Lenny Bruce e George Carlin; de escritores como Allen Ginsberg (“Howl”) e Jack Kerouack (“On the Road”), ou artistas como Andy Warhol. Todos, de uma forma ou de outra, surgiam como um desafio à América tradicional.

É neste contexto que os citados “Easy Rider” e “Midnight Cowboy” são acolhidos, tornando-se desde logo bandeiras da nova geração.

O Revisionismo

"The Wild Bunch", 1969>Também o cinema é afectado por esta contra-cultura, ainda que a princípio sofrendo a resistência dos estúdios e dos seus ideais conservadores. Os primeiros efeitos desta contra-corrente podem talvez ser perceptíveis no revisionismo que atravessava alguns dos géneros clássicos de Hollywood.

Desde o mais sagrado dos géneros americanos, o Western, ao filme de guerra, e aos policiais, os temas deixavam de ser a glorificação dos heróis, na luta incorruptível contra o mal. Com “The Wild Bunch” de Sam Peckinpah e “Little Big Man” de Arthur Penn, de 1969 e 1970 respectivamente, o Western questionava a violência e o avanço do homem branco contra os nativos. Com “M*A*S*H” de Robert Altman e “Patton” de Franklin J. Schaffner, ambos de 1970, a guerra confundia-nos sobre bons e maus, questionando sobre o seu papel ulterior na história da humanidade. Com “Bonnie And Clyde” de Arthur Penn (1967) e “Dirty Harry” de Don Siegel (1971) o policial passava a lidar mais com a personalidade humana, que com a história de mistério, deixando no ar a ideia de que o mal pode triunfar, e a justiça por conta própria é uma solução.

A Film School Generation

A Film School Generation: Steven Spielberg, Martin Scorsese, Biran De Palma, George Lucas e Francis Ford CoppolaA par desta nova leitura, a partir de realizadores da geração anterior, juntava-se a nova geração que não fora educada nos estúdios, não começara como actores, encenadores ou assistentes. Trata-se da chamada Film School Generation, a primeira geração de estudantes de cinema, na maior parte provenientes da USC (University of South California), UCLA (University of California, Los Angeles) e NYU (New York University).

Entre eles estão Martin Scorsese, Francis Ford Coppola, Steven Spielberg, George Lucas, Brian De Palma e John Milius. Distinguia-os um amor pelos clássicos (como D. W. Griffith, John Ford, Howard Hawks, Orson Welles e Alfred Hitchcock), mas também uma enorme admiração pelo cinema europeu como a Nouvelle Vague francesa (Truffaut e Goddard), o cinema de Michelangelo Antonioni ou de Akira Kurosawa. Era uma geração de estudiosos de diversas técnicas e estilos, ávida por experimentar, e por fazer tudo aquilo que nunca fora feito nos Estados Unidos. Iria aproveitar a renovação de nomes e aposta na juventude em Hollywood para um assalto ao poder.

O caminho não seria fácil, e começou no cinema independente, sob a inspiração de John Cassavetes, e o patrocínio de Roger Corman que ajudou a formar cineastas como Francis Ford Coppola, Martin Scorsese, Ron Howard, Peter Bogdanovich, John Milius, Jonathan Demme e James Cameron. Os seus filmes foram chamando a atenção de Hollywood, e cedo os colocaram entre os mais famosos realizadores de sempre.

O cinema da New Wave of Hollywood

Com um tão vasto leque de correntes e personalidades, o cinema que surge do final dos anos 60 até cerca de 1980, e que aqui se vai tratar tem uma série de características comuns.

"Deliverance", 1972

Em primeiro lugar o tom. Este é frequentemente pessimista e violento, focando os aspectos negativos da sociedade, não hesitando em mostrar como o mal triunfa. Tal pode surgir num filme de guerra como “Apocalypse Now”, na ficção científica mostrando-nos um futuro inquietante como em “A Clockwork Orange” ou num filme de gangsters como “Mean Streets”. Há ainda um maior ênfase no realismo das histórias, para o que contribui também o uso de filmagens no local. Em termos narrativos dá-se o recurso a enredos não resolvidos ou propositadamente deixados em aberto, com o intuito de nos provocar, chocar e deixar-nos em desconforto, como é o caso de “Deliverance” ou “One Flew Over The Cuckoo’s Nest”.

"Dog Day Afternoon", 1975Quanto à temática, para além da já citada tendência revisionista, há uma busca de temas difíceis, de que são exemplo conspirações políticas como “The Parallax View” ou “All The President’s Men”. Cresce o sentido do anti-herói esquizofrénico ou psicopata, um desajustado que procura fazer justiça pelas próprias mãos, ou é vítima do sistema, como em “Taxi Driver” ou “Dog Day Afternoon”.

Mesmo o musical surge alterado, como veículo da contra-cultura como são exemplos “Hair” e “Jesus Christ Superstar”. O próprio filme de terror surge transformado, mais inquietante, cruel e psicológico, como em “Carrie”, “The Shining” ou “The Exorcist”.

"Taxi Driver", 1976Em termos de forma assiste-se a um maior uso da narrativa não linear de influência europeia, e ao declínio da banda sonora de orquestra, produzida para o filme, em favor de novas tendências musicais (rock, psicadelismo, jazz, funk) associadas às novas gerações. O ritmo torna-se mais acelerado e a acção predominante.

O fim da New Hollywood

"Jaws", 1975Refere-se vulgarmente o enorme prejuizo do filme “Heaven’s Gate” de Michael Cimino (1980) como o final da era aqui descrita. O resultado foi o fim da United Artists (vendida à MGM, que a ressuscitaria mais tarde). De repente os estúdios perceberam que era tempo de limitar a liberdade dada aos realizadores da geração de Coppola, Bogdanovich, Cimino, Scorsese, etc. e voltar a exercer um controlo forte como na era dourada de Hollywood.

Star Wars, 1977A aposta foi então no lucro fácil, sugerido pelos filmes que se tornaram os maiores sucessos comerciais dos anos 70. E estes foram a saga “The Godfather” de Coppola, “Jaws” de Spielberg e a série “Star Wars” de George Lucas. Assim, ironicamente, a Film School Generation criava o blockbuster, e matava a New Hollywood Era que ajudara a criar.

Estava aberto o caminho a um novo cinema de grande aventura, heróis clássicos, vastos orçamentos e temas para toda a família, que iriam dominar a agenda de Hollywood nas décadas seguintes.

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