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La voce della luna Ivo Salvini (Roberto Benigni) teve recentemente alta da instituição psiquiátrica onde vinha sendo tratado. Ainda atormentado por vozes que julga ouvir na noite, Ivo deambula pelo campo em busca dos poços onde a voz da lua ecoa. Nessas deambulações vai privando com outros viajantes da noite, e convivendo com pessoas díspares como Nestore (Angelo Orlando), abandonado pela esposa porque passava o tempo nos telhados, os irmãos Micheluzzi, que querem capturar a Lua, ou o prefeito Gonnella (Paolo Villaggio), que vive no medo de ser seguido. Por entre escapadelas e presenças na vida social da aldeia, Ivo tenta ainda, em vão, cortejar a beleza local Aldina (Nadia Ottaviani).

Análise:

Em 1990, Federico Fellini estreava o último filme de uma longa carreira que fez dele uma das vozes mais interessantes e originais do cinema europeu do século XX. Terminando no registo que o tornara famoso, Fellini contava com a colaboração de Ermanno Cavazzoni para adaptar o romance deste “Il poema dei lunatici” (“O poema dos lunáticos” – onde lunáticos são tanto os loucos como os que seguem a lua), publicado em 1987, e que, como o nome deixa adivinhar, era mais uma entrada num mundo cheio do surrealismo poético a que o realizador nos habituara.

A história segue Ivo Salvini (Roberto Benigni), uma espécie de vagabundo romântico, de cuja proveniência pouco sabemos, mas que vemos ser bem recebido por todos os que encontra, como um velho conhecido, com quem todos simpatizam, mas com o qual se preocupam, pois terá saído recentemente de uma instituição psiquiátrica. Para cuidado de alguns, Ivo é atraído pela voz da lua que diz ouvir provinda dos poços no campo, o que o faz deambular, e entrar nos episódios de vida de diversos personagens meio surreais que vão surgindo nas suas caminhadas. Pelo meio, Ivo tenta cortejar Aldina (Nadia Ottaviani), com a ajuda da irmã dela (Syusy Blady), mas entrando-lhe no quarto à noite, e provocando a sua ira; visita a família; ouve as histórias de Nestore (Angelo Orlando), que acabou de ser deixado pela mulher, porque a sua única paixão é passear pelos telhados; e acompanha o prefeito Gonnella (Paolo Villaggio), que vê conspirações em todo o lado. Da festa da Gnocatta até à captura da Lua pelos irmãos Micheluzzi, sucedem-se episódios rocambolescos, os quais vão sempre deixar a Ivo a ideia de que é a Lua que o guia.

Com um Roberto Benigni que aqui sai da sua habitual persona histriónica para desempenhar um tímido e sonhador protagonista, Fellini constrói uma viagem por um mundo de sombras, escuridão e vozes lunares, que, se cheio de paisagens oníricas, é também uma viagem por gentes e momentos da Itália contemporânea, onde não faltam referências à tradição (como a gnocatta), ao peso da televisão e marketing (da Lua que cita publicidade à própria transmissão em torno da sua captura) a ferroadas ao próprio Silvio Berlusconi, ou à paranóia do poder (na pessoa do prefeito interpretado por Paolo Villaggio). Numa terra onde todos parecem ser um pouco loucos), e todos têm histórias loucas a contar (como se toda a terra fosse um hospício, e todas as personagens vivessem em realidades muito próprias, é Ivo Salvini quem todos olham de lado, talvez mais pela sua inocência que por essa citada loucura.

Filmando, desta vez, com mais cenários naturais que o habitual, Fellini consegue, novamente, criar uma paisagem ambígua (o tal onirismo), como a noite sempre sugere. Aí as histórias e personagens sucedem-se como um circo, nem sempre linear, como uma viagem ao jeito, por exemplo, do seu abertamente surrealista “Fellini-Satyricon” (1969), com o grotesco sempre por perto. Fá-lo agora numa loucura mais controlada, talvez mais triste ou decepcionada, e – como o acusou quem não gostou do filme – com muito menos originalidade, repetindo temas e personagens, mesmo que sempre numa mise-en-scène fabulosa.

Apresentando fora de competição em Cannes, “A Voz da Lua” foi premiado em Itália, mas não tão bem recebido no estrangeiro (por exemplo nem sequer conseguiu distribuição nos Estados Unidos), acabando por ficar descrito como um filme menor na carreira de Fellini. É que ninguém podia ainda saber que seria o último filme da carreira do mestre italiano.

Paolo Villagio e Roberto Benigni em "A Voz da Lua" (La voce della luna, 1990), de Federico Fellini

Produção:

Título original: La voce della luna; Produção: Cecchi Gori Group Tiger Cinematografica / Cinémax / RAI Radiotelevisione Italiana; Produtores Executivos: Bruno Altissimi, Maurizio Pastrovich, Claudio Saraceni; País: Itália / França; Ano: 1990; Duração: 116 minutos; Distribuição: Penta Distribuzione (Itália), Bac Films (França); Estreia: 30 de Janeiro de 1990 (Itália), 4 de Outubro de 1991 (Portugal).

Equipa técnica:

Realização: Federico Fellini; Produção: Mario Cecchi Gori, Vittorio Cecchi Gori; Co-Produção: André Djaoui; Produtora Associada: Ritza Brown; Argumento: Federico Fellini, Tullio Pinelli, Ermanno Cavazzoni [a partir do livro “Il poema dei lunatici” de Ermanno Cavazzoni]; Música: Nicola Piovani; Fotografia: Tonino Delli Colli [cor por Technicolor]; Montagem: Nino Baragli; Design de Produção: Dante Ferretti; Direcção Artística: Massimo Razzi; Cenários: Francesca Lo Schiavo; Figurinos: Maurizio Millenotti; Caracterização: Massimo De Rossi; Efeitos Especiais: Massimo Cristofanelli; Direcção de Produção: Roberto Mannoni.

Elenco:

Roberto Benigni (Ivo Salvini), Paolo Villaggio (Gonnella), Nadia Ottaviani (Aldina), Marisa Tomasi (Marisa), Angelo Orlando (Nestore), Sim (Oboeista), Syusy Blady (Susy), Dario Ghirardi (Jornalista), Dominique Chevalier (Terzio, Primeiro Irmão Micheluzzi), Nigel Harris (Giuanin, Segundo Irmão Micheluzzi), Vito (Terceiro Irmão Micheluzzi), Daniela Airoldi, Stefano Antonucci, Ferruccio Brembilla, Stefano Cedrati, Giampaolo Cocchi, Roberto Corbiletto, Giordano Falzoni, Mario Falcione, Francesco Gabriele, Fabio Gaetani, Ettore Geri, Franco Javarone, Lorose Keller, Luciano Manzalini, Arrigo Mozzo, Pippo Negri, Angela Parmigiani, Carmine Ponticiello, Patrizio Roversi, Roberto Russoniello, Concetta Sferrazza, Giorgio Soffritti, Massimo Speroni, Silvana Strocchi, Eraldo Turra, Arturo Vacquer.

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