Etiquetas
Billy Wilder, Cinema, Drama, Erich von Stroheim, Film Noir, Filme sobre Cinema, Gloria Swanson, Nancy Olson, William Holden
Sinopse:
Depois de morto, Joe Gillis (William Holden) narra os acontecimentos que levaram à sua morte. Escritor de argumentos para cinema, Joe tentava a sua sorte em Hollywood, mas via constantemente as portas serem fechadas. Fugindo dos cobradores a quem deve dinheiro, Joe vê-um dia se numa mansão de Hollywood, onde o acaso o coloca em conversa com a proprietária, a antiga estrela de cinema mudo Norma Desmond (Gloria Swanson). Ao descobrir que Joe é um escritor, Norma convida-o a preparar o seu regresso ao cinema com um filme escrito para ela.
Joe percebe que Norma vive num mundo de fantasia, alimentado pelo seu dedicado mordomo Max Von Mayerling (Erich von Stroheim), mas aceita participar de modo a receber o dinheiro de que necessita. O que Joe não antevê é como essa cedência à ilusão de Norma vai acabar por provocar mais ilusões e paixões que levarão à sua morte.
Análise:
“O Crepúsculo dos Deuses” é um daqueles filmes em que Hollywood se debruça sobre si própria, fazendo em simultâneo uma análise e homenagem daquilo que representa. Nesse sentido esta obra de Billy Wilder (um realizador que esteve na fase inaugural do Noir, e mais tarde se dedicaria à comédia), é ainda hoje um dos filmes mais frequentemente citados por Hollywood.
Com uma história escrita a meias com Charles Brackett, Wilder traz-nos um Noir atípico, já que, embora tenhamos desde o primeiro instante a consciência de que temos um crime a desvendar, passados poucos minutos já o esquecemos. Passamos então a preocupar-nos exclusivamente com a estranha e tumultuosa relação entre os protagonistas Joe Gillis (William Holden) e Norma Desmond (Gloria Swanson), a qual constitui o motor de todo o filme.
Narrado em flashback por Joe Gillis, “O Crepúsculo dos Deuses” dá-nos o invulgar artifício narrativo de nos trazer a narração de além da morte do seu autor. Assim, é com as palavras de um Joe Gillis já morto, que a história nos é contada. E a história é a de um homem cujo desespero financeiro o leva a aproveitar-se da insanidade de uma antiga actriz, para, alimentando-lhe (ou tolerando-lhe) as ilusões, ir ganhando algum dinheiro.
Embora de forma velada, por imposição do Código de Hays, Holden interpreta um dos primeiros gigolos de Hollywood, cujo emprego como escritor de Norma, é um eufemismo para uma relação que se torna bem mais que profissional (começa a viver numa garagem, passa para um quarto, acaba na cama da sua patrona). Se Joe se aproveita de Norma para ganhar dinheiro às custas de uma ilusão (torná-la de novo famosa no mundo do cinema), é ao mesmo tempo vítima da loucura, paixão deslocada e crises de ciúmes desta mulher que tenta controlá-lo e até humilhá-lo com um objecto seu, dos tempos em que o mundo parecia aos seus pés. Não negligível nesta charada é ainda o papel do dedicado mordomo Max (Erich von Stroheim), que alimenta cada uma das fantasias de Norma (é ele até quem escreve o correio de fãs), e vigia Joe com tenacidade, cuidando para que Norma nunca seja ferida.
Este estranho triângulo, em que nenhum lado é inocente, e cada um tenta usar os outras dois para os seus próprio fins, é quebrado com a chegada de um quarto elemento, que irá lançar luz sobre o negrume do triângulo. Essa pessoa é Betty Schaefer (Nancy Olson), a revisora que inicialmente chumbara os argumentos de Joe. Ao tornarem-se colaboradores, Betty e Joe vão sentir que a química que os une é mais que criativa. Betty é para Joe a porta para uma normalidade que este perdeu ao embarcar na doentia viagem de Norma. Vai ser por isso o catalizador da mudança que acabará em tragédia.
Mas para além das características que tornam “O Crepúsculo dos Deuses” um dos clássicos do Noir, como a belíssima fotografia, os planos inovadores (veja-se a cena inicial filmada de baixo), e o interior gótico da mansão de Norma, o filme é famoso pela sua leitura sobre a Hollywood em mudança.
Assim temos Gloria Swanson a interpretar um papel com o qual é relativamente familiar (a actriz esquecida depois do advento do sonoro), que apela ao realizador que a tornara famosa, interpretado pelo próprio Cecil D. DeMille (DeMille e Swanson colaboraram em vários filmes na era muda). Norma é mantida pelo seu mordomo Max, que se revelará mais tarde como seu antigo realizador e marido, o qual é interpretado pelo antigo realizador Erich von Stroheim (que de facto dirigiu Swanson). O filme que Norma projecta para Joe é um filme real “A Raínha Kelly” (Queen Kelly, 1929) com a jovem Gloria Swanson, e realizado por Erich von Stroheim. O filme conta ainda com diversos cameos de figuras do cinema, como Buster Keaton, e inúmeras referências a filmes e personalidades reais. Finalmente, não devemos esquecer que o próprio título “Sunset Boulevard” é um lugar real, morada de muitas estrelas de cinema, símbolo de excessos, de vidas irreais e uma espécie de museu de memórias do cinema. Memórias essas como o eram as personagens de Norma Desmond e Max Von Mayerling, e também os verdadeiros Gloria Swanson e Erich von Stroheim.
Sendo uma história de desespero, “O Crepúsculo dos Deuses” dá um novo significado à palavra “ilusão”, aqui pejorativo. Temos de um lado a ilusão que Joe se auto-impõe ao adbicar de qualquer escrúpulo, para viver facilmente às custas de uma mulher doente, e bastante mais velha que ele. Do outro lado, e muito mais inesquecível, a estrela cadente que, em vez de aceitar o seu destino, se ilude que ainda é amada pelo público (e por Joe), e tem regresso ao estrelato ao virar da esquina. A sua fuga e negação são totais no momento em que mata Joe (cujo crime fora chamá-la à realidade), e prefere ver os jornalistas que se acumulam à sua porta como uma equipa de filmagens do seu próprio filme. A forma como os encara é tão magistral que o seu “All right, Mr. DeMille, I’m ready for my close-up” se tornou uma das linhas mais famosas da história de Hollywood.
Gloria Swanson e William Holden são aliás perfeitos nos seus papéis, com uma interacção única, de dependências, chantagens e ilusões. O modo como trocam realismo com cinismo, memórias com críticas, fazem do filme uma sátira de humor negro subtil, mas mordaz. Os dois actores recebereriam nomeações para os Oscars por estes papéis.
Com as nomeações para Melhor Filme e Realizador, o filme recebeu um total de 11 nomeações, tendo vencido apenas nas categorias de Melhor Argumento, Melhor Direcção Artística e Melhor Banda Sonora. Mesmo assim, “O Crepúsculo dos Deuses” pela sua sátira e humor negro, terá ofendido muita gente famosa de Hollywood. Hoje é um marco de uma era do cinema.
Produção:
Título original: Sunset Boulevard; Produção: Paramount Pictures; País: EUA; Ano: 1950; Duração: minutos; Distribuição: Paramount Pictures; Estreia: 7 de Agosto de 1950 (Inglaterra), 11 de Maio de 1951 (Cinema Éden, Portugal).
Equipa técnica:
Realização: Billy Wilder; Produção: Charles Brackett; Argumento: Billy Wilder, Charles Brackett, D. M. Marshall; Música: Franz Waxman; Fotografia: John F. Seitz (preto e branco); Direcção Artística: Hans Dreies, John Mehaan; Montagem: Arthur Schmidt; Cenários: Sam Comer, Roy Moyer; Figurinos: Edith Head; Caracterização: Wally Westmore.
Elenco:
William Holden (Joe Gillis), Gloria Swanson (Norma Desmond), Erich von Stroheim (Max Von Mayerling), Nancy Olson (Betty Schaefer), Fred Clark (Sheldrake), Lloyd Gough (Morino), Jack Webb (Artie Green), Franklyn Farnum (Agente Funerário), Larry J. Blake (Primeiro Homem de Finanças), Charles Dayton (Segundo Homem de Finanças), Cecil B. DeMille (O Próprio), Hedda Hopper (A Própria), Buster Keaton (O Próprio), Anna Q. Nilsson (A Própria), H.B. Warner (O Próprio), Ray Evans (O Próprio), Jay Livingston (O Próprio).
Grande grande filme, grandiosa interpretação de Gloria Swanson, filme para a História sobre parte daquele passado que é cada vez mais o nosso presente.
Assisti este filme 3 vezes, um dos responsaveis por eu ser fanatico por cinema, musica,literatura, assim como “Cinema Paradiso” – 1986, assisti este com apenas 14 anos; ja cursei desenho/tive aulas de literatura no secundario. Isto aguçou meus sentidos pra cultura pop/underground na geral. Antigamente pra cultura não havia limites; ou sera que esse clichê mudou??!??