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Wake Wood Alice (Ella Connolly), uma menina de 9 anos, filha do veterinário Patrick (Aidan Gillen) e da farmacêutica Louise (Eva Birthistle), morre num ataque de um cão raivoso, o que lança os seus pais no desespero, levando-os a procurar reconstruir nova vida na remota aldeia de Wakewood. Aí, a dor não passa, e estranhas conversas de uma rapariga que está de volta depois de ter visto Alice, levam Louise a querer fugir. Na noite de fuga, o casal vai deparar com um ritual fantasmagórico, em que um corpo humano parece nascer de um monte disforme, chegando-lhes depois a revelação de que em Wakewood os mortos podem voltar para se despedir dos seus entes queridos.

Análise:

Regressada às lides cinematográficas com o filme inicialmente estreado na internet “Beyond the Rave” (2008), de Matthias Hoene, a Hammer Films produzia a sua segunda longa-metragem, agora destinada ao circuito alternativo, com passagem por festivais independentes e estreia em poucas salas, numa produção britânica cujas filmagens decorreram na Irlanda e na Suécia.

Nela conhecemos o casal Patrick (Aidan Gillen) e Louise (Eva Birthistle), que vivem em harmonia com a pequena filha Alice (Ella Connolly), quando um cão da clínica veterinária de Patrick a ataca e mata. Em dor, o casal deixa a sua casa e muda-se para o campo, em Wakewood, onde Patrick trata dos animais do campo, e Louise dirige a farmácia local. Mas, por mais que o tempo passe, a dor nunca deixa o casal, que se sente à beira do colapso. É então, quando pensavam deixar Wakewood, que Patrick e Louise deparam com um estranho ritual onde vêem alguém sair de dentro de um corpo, como um nascimento animal e fantasmagórico, observado pela população em transe. Confrontando o líder local, Arthur (Timothy Spall), este confessa-lhes que Wakewood possui forma de ressuscitar os mortos, por três dias, desde que eles não tenham morrido há mais de um ano. Patrick e Louise acedem a trazer Alice de volta, para passarem três dias com ela, mas Alice começa a comportar-se de modo estranho, e em breve a matar animais e pessoas, tudo porque os pais mentiram a Arthur, e Alice já morrera há mais de um ano. Quando a tentativa de fuga se gora, pois Alice não sobrevive para além da fronteira da aldeia, Patrick e Louise decidem entrega-la à floresta, mas num último momento Alice puxa Louise, que é levada com ela. Nove meses mais tarde, Louise é ressuscitada por três dias, e Patrick usa esse tempo para lhe fazer uma cesariana, já que ela engravidara antes de morrer.

Inserido naquilo a que se pode chamar folk horror – isto é, um subgénero de terror que versa sobre cultos/bruxaria/magia negra passados em comunidades remotas e algo isoladas – “A Floresta dos Regressados” é um filme amargo que lida com a dor da perda e formas radicais de a tentar negar. Nesse sentido, o filme realizado por David Keating pode ser visto por um prisma diferente, quase como uma alegoria para os fantasmas de um casal que perdeu a filha ainda criança e tem de se reinventar se quiser voltar a funcionar como casal, onde os ciclos de nascimento e morte têm tanto de literal como de alegórico e mesmo de catártico.

Aqui, essa tal reinvenção dá-se na partida de Patrick e Louise para a misteriosa Wakewood, onde todos são uma unida família, que tudo trata com algum segredo, sob comando aristocrático do patriarca local, Arthur, que lembra a figura de Christopher Lee no seminal “O Sacrifício” (The Wicker Man, 1973), de Robin Hardy, no seu jeito condescendente e superior de tratar o universo à sua forma, onde o segredo e superstição que ele garante são a razão de ser e de viver de toda a comunidade.

Sem perder oportunidade de mostrar sangue – não fosse a Hammer a produtora que nos deu sangue vermelho a rodos, quando ele estava banido dos grandes ecrãs, sobretudo nos filmes a cores – nem que seja no nascimento de um bezerro, que depois vai ser metáfora para os sangrentos renascimentos rituais que trarão de volta os mortos, o terror de “A Floresta dos Regressados” não se baseia em sustos nem assombrações sobrenaturais, procurando o horror nos sentimentos humanos, a já citada dor da perda, a apatia, a incapacidade de viver e o desmoronamento de um projecto de vida. Com essa espinha dorsal, tudo o que virá (isto é, o terrível segredo de Wakewood), não será para Patrick e Louise tão horrível por si só como o é pelo avolumar dessa dor, mesmo que na aparência de a combater.

Por isso, assim que somos expostos ao segredo de Wakewood – no tal ritual sangrento de magia negra que relembra os partos feitos pelo protagonista veterinário – é-nos claro que o casal vai querer embarcar nessa viagem ao desconhecido que é ressuscitar a filha morta, contra toda a lógica e até contra as regras da comunidade, facto pelo qual vai pagar duramente. O filme torna-se então uma história de uma criança demoníaca, que vai descarrilar numa espécie de slasher, provocando um final de mais sacrifícios.

Mas, e apesar dos vários desequilíbrios que se vão acumulando, “A Floresta dos Regressados” vale pela bizarria que traz, e por toda a atmosfera de amargura e dor, verdadeiros horrores, comparados com os quais a tal magia negra nada conta. Filmado de um modo cru, com sobreposições de momentos distantes como miríades de flashbacks que interagem com a narrativa presente, o filme tem um modo visceral de perturbar o espectador, o que é, afinal o seu objectivo principal.

Eva Birthistle, Ella Connolly e Aidan Gillen em "A Floresta dos Regressados" (Wake Wood, 2009), de David Keating

Produção:

Título original: Wake Wood; Produção: Exclusive Film Distribution / Vertigo Films / Hammer Films / Bord Scannán na hÉireann (The Irish Film Board) / Fantastic Films / Solid Entertainment / Film i Skåne / Swedish Film Institute / Raidió Teilifís Éireann (RTÉ) / Irish Film Industry; Produtores Executivos: Simon Oakes (Exclusive Film Distribution), Marc Schipper (Exclusive Film Distribution), Alan Maher (Irish Film Board); Co-produtores Executivos: Rupert Preston (Vertigo Films), Allan Niblo (Vertigo Films), Ben Holden (Exclusive Film Distribution), Patrick Irwin (Exclusive Film Distribution); País: Irlanda / Reino Unido; Ano: 2009; Duração: 90 minutos; Distribuição: Exclusive Film Distribution, Vertigo Films (Reino Unido); Estreia: 25 de Setembro de 2009 (Lund Fantastisk Film Festival, Suécia), 25 de Março de 2011 (Reino Unido).

Equipa técnica:

Realização: David Keating; Produção: Brendan McCarthy, John McDonnell; strong>Co-Produção: Magnus Paulsson, Ralf Ivarsson (Film i Skåne); Produtor em Linha: Natasha Banke (Suécia); Argumento: Brendan McCarthy, David Keating [a partir de uma história de Brendan McCarthy]; Música: Michael Convertino; Fotografia: Chris Maris; Montagem: Tim Murrell, Dermot Diskin; Design de Produção: John Hand; Direcção Artística: Owen Power; Figurinos: Louise Stanton; Caracterização: Kaj Grönberg; Efeitos Especiais: Gerry Johnston; Efeitos Visuais: Florian Obrecht (Suécia), Andreas Schellenberg; Direcção de Produção: Steven Davenport.

Elenco:

Aidan Gillen (Patrick), Eva Birthistle (Louise), Timothy Spall (Arthur), Ella Connolly (Alice), Ruth McCabe (Peggy O’Shea), Brian Gleeson (Martin O’Shea), Amelia Crowley (Mary Brogan), Dan Gordon (Mick O’Shea), Tommy McArdle (Tommy), John McArdle (Ben), Aoife Meagher (Deirdre), Siobhán O’Brien (Cliente na Farmácia), Alice McCrea (Cliente), Johnny Fortune (Mecânico), John Hand (Ajudante de Arthur), Darragh Hand (Ajudante de Arthur), Steven McDonnell (Rapaz nos Campos), Simple (O Touro).

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