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Cinema, David Naughton, Gore, Griffin Dunne, Jenny Agutter, John Landis, John Woodvine, Lobisomem, Terror
David (David Naughton) e Jack (Griffin Dunne) são dois jovens norte-americanos que viajam pelo interior da Inglaterra. Meio perdidos nas charnecas, vão dar a uma estalagem rural onde são recebidos com desconfiança. Os dois acabam por sair para a noite, sendo atacados por um animal. Jack morre, e David é ferido, para acordar no hospital com o fantasma de Jack a dizer-lhe que ele agora é um lobisomem, pois foi por um lobisomem que eles foram atacados. Embora David não queira acreditar, estranhos sonhos e apetites começam a fazê-lo temer ser essa a verdade, e que nem a sua benfeitora, a enfermeira Alex Pierce (Jenny Aguter), que o acolhe em casa, esteja a salvo.
Análise:
Nome conhecido no registo da comédia do início dos anos 80, John Landis conseguiria com “A República dos Cucos” (National Lampoon’s Animal House, 1978) e “O Dueto da Corda” (The Blues Brothers, 1980) dois grandes sucessos (ambos com John Belushi, e o segundo com Dan Ackroyd) que marcariam a sua carreira a partir daí. Mas foi no domínio do terror que o realizador se estreou, no fracasso “Schlock” (1971), uma espécie de homenagem aos filmes B dos anos 50, num registo cómico, que repetiria, agora com um enorme sucesso, em 1981 com “Um Lobisomem Americano em Londres”. Seguia-se a amizade com Spielberg, e mais uma série de comédias, tendo Dan Ackroyd e Eddie Murphy como habituais actores. Mas, mesmo que não tenha sido o mais rentável dos seus filmes, “Um Lobisomem Americano em Londres” é talvez o seu filme mais original, pela forma como mescla terror e comédia, sem nunca desrespeitar o primeiro, nem abusar da segunda.
Logo a começar no nome, que nos dá um certo aligeirar do tema, “Um Lobisomem Americano em Londres” conta-nos a história de dois estudantes norte-americanos, David (David Naughton) e Jack (Griffin Dunne), semi-perdidos na paisagem rural inglesa, que começam a considerar um mau destino. Não falta a visita a uma estalagem, onde os locais vêm os forasteiros com desconfiança, como se estivéssemos num filme clássico da Hammer. E se aqui ninguém pergunta pelo castelo de Drácula, a pergunta que despoleta animosidades é por um pentagrama desenhado na parede. A saída para a noite, e consequente perda nas charnecas sem fim, e os uivos ameaçadores resultam num ataque de um animal. Jack é atacado, e quando David teme pela sua vida, um dispara mato o animal, que afinal parece um homem. Quando David acorda no hospital, é-lhe dito que Jack morreu. Mas este surge, como um cadáver ambulante, dizendo a David que tem de se matar, pois o que os atacou foi um lobisomem, e agora carrega ele a maldição. Enquanto David não morrer, todas as vítimas deambularão como fantasmas. Sem ter para onde ir, David é hospedado pela enfermeira Alex Price (Jenny Agutter), enquanto o seu médico (John Woodvine) decide investigar o caso, pois algo não bate certo na história da polícia. Chegada a nova noite de lua cheia, David transforma-se e acorda de manhã num Jardim Zoológico. Vendo que nessa noite houve gente morta, David explica a Alex o que passou, e tenta que o prendam, mas não é levado a sério. Na noite seguinte transforma-se num cinema, e mata todos os ocupantes, e alguns polícias, acabando encurralado num beco, com Alex a tentar salvá-lo. Sem a reconhecer, David acaba morto pela polícia.
Com os personagens de David Naughton e Griffin Dunne a surgirem pela primeira vez numa carrinha de ovelhas, para se dirigirem a uma estalagem chamada “The Slaughtered Lamb” (o cordeiro chacinado), onde recebem um tratamento frio, digno dos filmes clássicos de terror, sabemos que estamos em território de homenagem, mas também de algum humor. Este vai permanecer em todo o filme, sobretudo na forma como o fantasma de Jack surge e fala a David, ou na forma como este se expressa e se procura fazer entender, quase sempre sem resultados. O humor não poupa os polícias, que aqui são figuras a ser ridicularizadas pela sua total incompreensão, razão pela qual o Inspector Villiers (Don McKillop) sofrerá uma morte violenta.
Mas “Um Lobisomem Americano em Londres” está longe de ser uma simples comédia. Se, como dito atrás, em jeito de homenagem todos os elementos clássicos de terror são desde logo explanados, esse terror vai surgir em doses fortes, seja na sequência do ataque, nos sustos das aparições de Jack, e revelações em sonhos perturbadores, cheios de violência e momentos de arrepiar os cabelos da nuca. Claro que a cereja no topo do bolo é a transformação de David em lobisomem, talvez a mais bem conseguida em termos plásticos do cinema até então. Nela, Landis criava um ícone, e mostrava o seu engenho para gerir o momento, com planos curtos e sequências céleres que criam no espectador a sensação de desconforto de viver uma transformação escabrosa e dolorosa. Esse seu jeito seria captado por Michael Jackson, que logo de seguida chamaria Landis para dirigir o seu celebérrimo (e também com trejeitos de filme de terror) “Thriller” (1983), o qual se tornaria um pequeno filme de 13 minutos que mudaria para sempre a história dos videoclips musicais.
Alicerçado na sequência da transformação, temos uma história que não surpreende, não reinventa, nem estraga o mito dos lobisomens como o cinema nos deu a conhecer. Apenas inova na abordagem, pelo lado cómico que tem como efeito tornar mais trágico o fim de David, um personagem de quem, tal como a sua benfeitora inglesa, interpretada por Jenny Agutter, aprendemos a gostar. “Um Lobisomem Americano em Londres” é, por isso, também uma tragédia anunciada (desde o título), quase em jeito grego, onde a húbris é a da revolta juvenil que leva os protagonistas a aventurar-se nos campos, por lugares que deviam ter deixado em paz. A partir da primeira aparição de Jack, os dados estão lançados. Resta-nos saber como vai David reagir perante a realidade que não quer aceitar.
O filme termina numa apoteose de violência em Picadilly Circus (na sua menos interessante sequência), onde nem o amor de Alex salva o selvagem lobisomem, que por entre algumas cenas tragicamente cómicas nos trouxe muito gore, como o filme prometia.
John Landis tinha conseguido um equilíbrio perfeito dos seus ingredientes, e nesse misto de comédia e terror, com laivos de drama coming of age, conseguia um dos seus trabalhos mais adorados pelos fãs, hoje um filme de culto, digno representante do gore dos anos 80, reinando na era dos clubes de vídeo.
“Um Lobisomem Americano em Londres” seria o primeiro vencedor do Oscar de Melhor Maquilhagem, prémio criado nesse ano. O seu sucesso levaria a uma espécie de sequela, intitulada “Um Lobisomem Americano em Paris” (An American Werewolf in Paris, 1997), realizado por Anthony Waller, com Julie Delpy a interpretar uma filha da breve relação entre David e Alex.
Produção:
Título original: An American Werewolf in London; Produção: PolyGram Filmed Entertainment / Lyncanthrope Films; Produtores Executivos: Peter Guber, Jon Peters; País: Reino Unido / EUA; Ano: 1981; Duração: 97 minutos; Distribuição: Universal Pictures (EUA), Barber International (Reino Unido); Estreia: 21 de Agosto de 1981 (EUA), 28 de Maio de 1982 (Portugal).
Equipa técnica:
Realização: John Landis; Produção: George Folsey Jr.; Argumento: John Landis; Música: Elmer Bernstein; Fotografia: Robert Paynter [cor por Technicolor]; Montagem: Malcolm Campbell; Direcção Artística: Leslie Dilley; Figurinos: Deborah Nadoolman; Caracterização: Robin Grantham, Beryl Lerman; Efeitos Especiais de Caracterização: Rick Baker; Direcção de Produção: Joyce Herlihy.
Elenco:
David Naughton (David Kessler), Jenny Agutter (Enfermeira Alex Price), Griffin Dunne (Jack Goodman), John Woodvine (Dr. J. S. Hirsch), Brian Glover (Jogador de Xadrês), Lila Kaye (Barmaid), David Schofield (Jogador de Dardos), Paul Kember (Sargento McManus), Frank Oz (Mr. Collins / Miss Piggy), Don McKillop (Inspector Villiers).
Quando era criança, tinha eu 8 anos, vi este filme num sábado à noite (nas tais sessões da meia-noite da RTP) e fiquei aterrorizado! Nunca um filme de terror me tinha provocado tanto medo.
Passados muitos anos revi este filme e pensei: “Ai era isto que tanto medo me provocou?! Mas isto é pouco assustador!”.
Concordo que a transformação em lobisomem do protagonista é, de facto, muito bem feita e ainda por cima numa época em que não havia efeitos digitais.
A sequência em que David está a sonhar (a aparição de esqueletos fardados de nazis a disparar contra tudo e todos) parece-me uma homenagem do realizador a filmes de guerra de série B.
Este filme para mim é especial por razões semelhantes. Fui vê-lo no cinema, tinha eu uns 10, 11 anos, e no cartaz dizia “maiores de 16”. Para piorar fui com um primo mais novo. Tentámos esconder-nos um atrás do outro enquanto o porteiro nos aceitava os bilhetes com ar desconfiado, mas lá entrámos com um alívio. O pior veio depois. No dia seguinte descobrimos que nenhum dos dois tinha pregado olho nessa noite. Bons tempos! 🙂
Faltou acrescentar que, para mim, o filme hoje ainda se sai bem, e bate aos pontos a maioria do que se faz dentro do género.