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Per un pugno di dollariUm estranho pistoleiro americano (Clint Eastwood) chega a uma aldeia mexicana de fronteira, dominada por dois bandos que atemorizam a aldeia. De um lado está Don Miguel Rojo (Antonio Prieto), e do outro John Baxter (Wolfgang Lukschy). Aí, com a ajuda do dono do saloon, Silvanito (José Salvo), o estranho vai tentar eliminar os dois bandos, colocando um contra o outro, tendo para isso que vencer o cruel Ramón Rojo (Gian Maria Volontè), salvar a amante forçada deste, Marisol (Marianne Koch), e deslindar o mistério de um roubo de ouro ao exército e tráfico de armas.

Análise:

Sergio Leone era já um nome importante no cinema italiano quando se auto-atribuiu a pouco modesta tarefa de reinventar o Western. Tendo começado no cinema na década de 1940, Leone foi um dos muitos beneficiários do período que ficou conhecido como «Hollywood no Tibre», que percorreu os anos 1950. Foi um tempo em que as principais produtoras de Hollywood, reconhecendo o valor dos avançados e pouco explorados estúdios Cinecittà, a luz de Roma e seus lindíssimos cenários naturais, mudou para a Itália a produção de muitos filmes para assim lhes baixar os custos. Nessas produções trabalhavam também actores secundários e muitos técnicos italianos, incluindo assistentes de realização. Foi esse o caso de Sergio Leone, que teve o seu nome ligado a muitas importantes produções norte-americanas, por vezes realizando ele mesmo secções dos filmes, ainda que nem sempre creditado. São exemplos, “Quo Vadis” (1951) de Mervyn LeRoy, e “Ben-Hur” (1959) de William Wyler.

Em nome próprio, Sergio Leone, mostrando a influência americana, que seria responsável pelo chamado cinema de género (cinema que seguia de perto géneros famosos nos Estados Unidos, feito para as grandes massas: western, filme histórico, policial, guerra, terror, etc.), estreava-se no peplum com “Os Últimos Dias de Pompeia” (Gli ultimi giorni di Pompei, 1959), creditado como Mario Bonnard, e com “O Colosso de Rodes” (Il Colosso di Rodi, 1961). Mas o seu coração estava no mais americano dos géneros, o western, que Leone via como estando em decadência nos Estados Unidos, e cuja versão italiana era demasiado presa a clichés risíveis.

Surge assim uma tentativa séria de reabilitação do western, filmando-o na Europa, com histórias dramáticas, e incluindo um modo de estar italiano, que para Leone seria a salvação do género. Essa tentativa chama-se “Por um Punhado de Dólares”, que Sergio Leone ajudou a escrever, e para a qual aceitou um aspecto anglófono (algo em voga no cinema de género italiano), para melhor penetração nos mercados internacionais. Por isso assinou-o sob o pseudónimo de Bob Robertson, e o mesmo fizeram alguns dos seus colaboradores: o compositor Ennio Morricone ficou creditado como Dan Savio, e a estrela Gian Maria Volontè, como Johnny Wels, para citar apenas três de muitos casos.

Faltava uma estrela norte-americana que se pudesse facilmente associar ao western, e Leone tentou muitos nomes, de Henry Fonda a James Coburn e Charles Bronson. Depois de algumas incompatibilidades de cache e desinteresse de muitos actores, a escolha acabou por recair no jovem Clint Eastwood, então conhecido pelo seu papel de cowboy na série televisiva “Rawhide”, que durou de 1959 a 1965.

Com alguns papéis secundários no cinema e televisão, Clint Eastwood, então com 34 anos, teve em “Por um Punhado de Dólares” finalmente uma oportunidade para encabeçar um elenco para o grande ecrã, já que estava contratualmente proibido de aceitar papéis no cinema norte-americano. Fê-lo, encarnando um papel que era afinal o do herói solitário Yojimbo, do filme “Yojimbo, o Invencível”, realizado por Akira Kurosawa em 1961, e que servia de base para o filme de Leone. O realizador passaria mesmo por um processo de tribunal, no qual sempre afirmou ter-se inspirado em diversas fontes, e não apenas no filme de Kurosawa.

Tal como em “Yojimbo”, temos em “Por um Punhado de Dólares” a história de um herói solitário (Eastwood) que chega a uma aldeia dominada pela guerra entre dois bandos rivais, os Baxter e os Rojo. O herói, que alguns chamam Joe, mas nunca diz o seu nome, sendo geralmente tratado por «americano», vê na situação um desafio, livrar a aldeia dos dois bandos fazendo-os eliminar-se um ao outro.

Contando apenas com o auxílio do dono do saloon, Silvanito (José Salvo), Joe vai primeiro matar alguns homens de John Baxter (Wolfgang Lukschy), para a seguir se colocar ao serviço de Don Miguel Benito Rojo (Antonio Prieto). Aí consegue espiar um golpe dado por Ramón Rojo (Gian Maria Volontè), que rouba ouro do exército mexicano, disfarçando os seus homens de militares norte-americanos. Joe começa por provocar um recontro entre os Rojo e os Baxter no cemitério, enquanto descobre o ouro e rapta Marisol (Marianne Koch), amante forçada de Ramón. Entregando Marisol aos Baxter, promove a troca dela por Antonio Baxter, prisioneiro dos Rojo. Segue-se um violento ataque dos Rojo aos Baxter, durante o qual, Joe mata os guardas de Marisol, e devolve-a ao marido e filho para que fujam. Finalmente, e depois de torturado pelos Rojo, Joe foge, com ajuda do coveiro Piripero (Joseph Egger), para regressar e matar os Rojo restantes, incluindo Ramón.

Com uma tentativa de recuperar a fotografia de grandes espaços de John Ford, Leone filmou na Espanha, procurando, por outro lado, a acção e modo narrativo dos filmes de Kurosawa. Acrescenta-lhe já um lado operático, que desenvolveria nos filmes seguintes, e que carrega cada cena de um dramatismo feito de pathos, um modo lento de filmar, enquadramentos cuidados, e um uso demorado de close-ups intensos, não como reacção, mas como mote para as linhas de acção que se seguirão. Para isto contribui muito a serenidade e frieza de Clint Eastwood, que, com o seu «uomo senza nome» (homem sem nome), de cigarro (que nunca acende) poncho, e olhar semicerrado sob um chapéu que quase lhe cobre os olhos, criaria um paradigma querido a Leone.

Com um humor que chega a ser sádico, mas é visivelmente satírico, “Por um Punhado de Dólares” surpreende tanto pela reinvenção que consegue, como pelo uso dos clichés (a postura do herói, as mortes, o trabalho dos duplos) de um modo propositadamente icónico. Numa altura em que o western americano se tornava mais moralista, e menos aventureiro, as ideias de Leone chegavam contra a corrente, num filme amoral, que quase faz o elogio da violência como um modo de vida. Ao mesmo tempo, a banda sonora de Ennio Morricone começava a marcar um novo sentido na música dos westerns, com o compositor a assinar a partir daí trabalhos memoráveis, ao ponto de mais tarde se tornar difícil imaginar um western sem a sua música.

Como sempre acontecia nestas produções, o filme foi rodado sem som, com os actores (ou quem os dobrava) a acrescentarem os diálogos em estúdio, produzindo-se assim várias versões de acordo com a língua pretendida. Clint Eastwood apenas adicionaria a sua voz ao filme em 1967, quando foi finalizada a versão para o mercado norte-americano. Na versão italiana, a sua voz é dobrada por Enrico Maria Salerno.

“Por um Punhado de Dólares” foi um sucesso imediato em Itália, sendo o filme mais rentável do ano. Embora só estreando nos EUA três anos depois, o filme foi também bem-sucedido junto do público, levando a um relançamento em 1969, apesar de alguns críticos o acharem excessivamente violento. A sua apresentação em televisão foi precedida de um prólogo de quatro minutos, realizado por Monte Hellman, com imagens de arquivo de Clint Eastwood, para o fazer contracenar com Harry Dean Stanton.

Com o passar dos anos, “Por um Punhado de Dólares” começou a ser considerado como um marco, tanto no estabelecimento do Western Spaghetti, como no renovar do western em geral, contribuindo para uma nova iconografia, e um modo de filmar que influenciaria novas gerações de realizadores, entre os quais se conta Quentin Tarantino, um dos mais acérrimos defensores de Sergio Leone. E com este filme nascia mais um mito em Hollywood, Clint Eastwood.

O filme foi restaurado digitalmente em 2014, pela Cineteca de Bolonha e a Unidis Jolly Film.

Clint Eastwood e Gian MAria Volontè em "Por um Punhado de Dólares" (Per un pugno di dollari, 1964) de Sergio Leone

Produção:

Título original: Per un pugno di dollari [Título inglês: A Fistful of Dollars]; Produção: Jolly Film / Constantin Film Produktion / Ocean Films; País: Itália / República Federal Alemã / Espanha; Ano: 1964; Duração: 96 minutos; Distribuição: Unidis (Itália), Constantin Film (RFA), Ízaro Films (Espanha), United Artists; Estreia: 12 de Setembro de 1964 (Itália), 21 de Outubro de 1966 (Portugal).

Equipa técnica:

Realização: Sergio Leone; Produção: Arrigo Colombo [como Harry Colombo], Giorgio Papi [como George Papi]; Produtor Assistente: Piero Santini; Argumento: Sergio Leone, Víctor Andrés Catena, Jaime Comas Gil, Fernando Di Leo [não creditado], Duccio Tessari [não creditado], Tonino Valerii [não creditado]; História: Sergio Leone, Adriano Bolzoni, Víctor Andrés Catena; Música: Ennio Morricone [como Dan Salvio]; Arranjos corais: Alessandro Alessandroni; Fotografia: Massimo Dallamano [como Jack Dalmas], Federico G. Larraya [filmado em Techniscope, cor por Technicolor]; Montagem: Roberto Cinquini [como Bob Quintle]; Direcção Artística: Carlo Simi [como Charles Simons]; Cenários: Carlo Simi [como Charles Simons]; Figurinos: Carlo Simi [como Charles Simons]; Caracterização: Sam Watkins, José María Sánchez [não creditado]; Efeitos Especiais: Giovanni Corridori [como John Speed]; Direcção de Produção: Franco Palaggi [como Frank Palance], Günter Raguse.

Elenco:

Clint Eastwood (Joe), Marianne Koch (Marisol), Gian Maria Volontè [como Johnny Wels] (Ramón Rojo), Wolfgang Lukschy (John Baxter), Sieghardt Rupp (Esteban Rojo), Joseph Egger (Piripero), Antonio Prieto (Don Miguel Benito Rojo), José Calvo (Silvanito), Margarita Lozano (Consuelo Baxter), Daniel Martín (Julián), Benito Stefanelli [como Benny Reeves] (Rubio), Mario Brega [como Richard Stuyvesant] (Chico), Bruno Carotenuto [como Carol Brown] (Antonio Baxter), Aldo Sambrelli (Membro do bando Rojo).

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