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Adriano Giannini, Cinema, Cinema italiano, Drama, Drama Criminal, Gilberto Idonea, Olivia Magnani, Paolo Sorrentino, Toni Servillo
Titta di Girolamo (Toni Servillo) é um homem de meia idade, recluso num hotel de luxo na Suíça, preso a uma rotina monótona, que passa pelo observar indiferente do que se vai passando no lobby, e cioso do seu espaço, onde não deixa que ninguém entre, nem sequer com uma pergunta. Paira uma curiosidade sobre a proveniência do seu dinheiro, e do porquê de, regularmente, ir ao banco depositar uma mala de dinheiro, que exige que seja contado manualmente. Quando a empregada Sofia (Olivia Magnani) consegue quebrar a barreira, Titta decide que é hora de quebrar as regras da reclusão imposta pela máfia, o que, coincidindo com o roubo de uma mala, o leva de volta a Itália para prestar contas.
Análise:
Depois da sua primeira longa-metragem “One Man Up” (L’uomo in più, 2001), vencedora do Nastro d’Argento para Melhor Novo Realizador, Paolo Sorrentino conseguiria o reconhecimento internacional com “As Consequências do Amor”, filme que, tal como o anterior, era escrito por si, e repetia a colaboração com aquele que se tornaria o seu actor fetiche, Toni Servillo.
Começando a traçar o seu caminho de histórias sérias, dedicadas a analisar a psique de protagonistas solitários, mas sempre com um toque subtil de absurdo, “As Consequências do Amor” centra-se em Titta di Girolamo (Toni Servillo), um homem que vemos desde o primeiro momento, recluso num hotel de luxo na Suíça, onde se limita a observar o que tem em torno, com uma paciência que só é rivalizada pela indiferença que parece sentir por tudo. Com ares de superioridade que aos poucos incomodam quem com ele se cruza, Titta mantém uma rotina fixa, que inclui sentar-se no lobby, jogar cartas com os mesmos parceiros, e receber regularmente uma mala com dinheiro que vai depois depositar num banco. Através de alguns telefonemas para a mulher que deixou, e os filhos que não lhe querem falar, e também de esparsas narrativas off em modo confessional, apercebemo-nos de que Titta é um recluso da máfia, por erros passados, «condenado» a servir de correio.
O ponto de mudança é a insistência de Sofia (Olivia Magnani), empregada do hotel, qye vai deixando a curiosidade por Titta dominá-la, e a irritação pela indiferença dele leva-a a agir. Mas se os dois iniciam uma relação pouco mais que platónica, esta é atalhada por uma traição de dois mafiosos que levarão Titta a ter que voltar a Itália para se justificar.
Logo na sua segunda longa-metragem, Paolo Sorrentino definia duas das características principais dos seus filmes, o olhar para uma vida, que não é já jovem e está em momento de balanço, e um protagonista de certo modo alienado do ambiente que o envolve, e com dificuldade em ligar-se a algo ou alguém. Esse protagonista, tantas vezes interpretado por Toni Servillo, é frio, distante, e (como diz um dos personagens a dada altura) com uma cara de póquer a toda a prova. Tal forma de estar, aliada ao ritmo lento do filme, cria toda uma atmosfera de espera e olhar metódico, quase voyeurista sobre aquilo que rodeia Titta (note-se a forma como escuta os vizinhos com um estetoscópio).
Aos poucos vamos percebendo as suas razões, a mágoa dos erros passados, do que perdeu (país, família, identidade, vontade de viver), e essa constatação impressiona-nos muito mais, dada a sua impavidez e até sobranceria, que aos poucos vamos percebendo serem antes de tudo sinais de uma depressão mecânica, onde a necessidade de questionar e de inovar já há muito se perderam.
Tudo isto é filmado com uma incrível elegância, com um câmara sempre em movimento, que inclui varrimentos bruscos, planos rápidos e montagem complexa, numa fotografia de uma clareza excepcional. Desse modo, Sorrentino traz-nos, quando necessita, uma dinâmica que contrasta com a passividade dos personagens. Esta dinâmica é ainda marcada pela banda sonora, rica e por vezes desconcertante, tanto quanto o desenrolar da história que sem que o percebamos se torna um thriller intenso, de final inesperado, mas que é, afinal a saída perfeita para o protagonista, e evidência cabal do drama que antes vivera, e que nunca nos transmitira por palavras.
Sem darmos por isso, uma história que parece banal, prende, fascina, surpreende, e deixa-nos levar no seu ritmo, nos seus episódios banais, e num certo voyeurismo que nos faz sentir no centro de cada plano. Como se não bastasse, Toni Servillo é simplesmente perfeito, criando um personagem único, onde força e fraqueza, indiferença e dor, são separadas por linhas muito ténues, e tudo nos é narrado nos seus gestos sóbrios e expressões quase ausentes.
Produção:
Título original: Le conseguenze dell’amore; Produção: Fandango / Indigo Film / Medusa Film; Produtores Executivos: ; País: Itália; Ano: 2004; Duração: 95 minutos; Distribuição: Medusa Distribuzione (Itália); Estreia: 13 de Maio de 2004 (Cannes Film Festival, França), 24 de Setembro de 2004 (Itália).
Equipa técnica:
Realização: Paolo Sorrentino; Produção: Domenico Procacci, Nicola Giuliano, Francesca Cima, Angelo Curti; Argumento: Paolo Sorrentino; Música: Pasquale Catalano, Nicolas Errèra; Orquestração: Giuseppe Sasso; Fotografia: Luca Bigazzi [fotografia digital]; Montagem: Giogiò Franchini; Design de Produção: Lino Fiorito; Figurinos: Ortensia De Francesco; Caracterização: Fernanda Lucia Perez; Efeitos Especiais: Luca Ricci; Efeitos Visuais: Stefano Marinoni, Paola Trosoglio; Direcção de Produção: Viola Prestieri, Gennaro Formisano, Chiara Cordaro.
Elenco:
Toni Servillo (Titta di Girolamo), Olivia Magnani (Sofia), Adriano Giannini (Valerio), Antonio Ballerio (Gerente do Banco), Gianna Paola Scaffidi (Giulia), Nino D’Agata (Mafioso), Vincenzo Vitagliano (Pippo D’Antò), Diego Ribon (Director), Gilberto Idonea (Assassino Contratado), Giselda Volodi (Empregada), Giovanni Vettorazzo (Letizia), Gaetano Bruno (Assassino Contratado), Ana Valeria Dini (Leitora), Vittorio Di Prima (Nitto Lo Riccio), Angela Goodwin (Isabella), Raffaele Pisu (Carlo)
Sorrentino, um hino à Poesia Cinematográfica