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Cinema, David Suchet, Espionagem, Guerra Fria, John Schelsinger, Lori Singer, Pat Hingle, Richard Dysart, Robert Lindsey, Sean Penn, Thriller, Timothy Hutton
O ex-seminarista Christopher Boyce (Timothy Hutton) tem a oportunidade de trabalhar para a RTX, uma empresa que compila informação tendencialmente secreta vinda de outras agências. Crendo estar em posse de informações importantes, e numa altura em que está descontente com a política internacional dos Estados Unidos, Boyce, fala com o amigo e traficante de droga Daulton Lee (Sean Penn), para este tentar vender documentos na embaixada russa no México. Lee entra em contacto com o agente de nome de código Alex (David Suchet), que lhe vai pagando, mas pedindo sempre mais documentos, já que os recebidos são inconclusivos. Cedo Boyce percebe que entrou num jogo do qual não consegue sair, não só porque os russos não deixarão, como porque o amigo já não quer desistir do dinheiro fácil que tem vindo a ganhar.
Análise:
O livro de 1979 “The Falcon and the Snowman: A True Story of Friendship and Espionage” um relato de Robert Lindsey, sobre um caso real envolvendo dois jovens norte-americanos que vendiam segredos de Estado à União Soviética, foi o ponto de partida para o filme de John Schelsinger “O Jogo do Falcão”. Este era já um realizador de renome, associado a alguns dos maiores êxitos da chamada Nova Era de Hollywood, como “O Cowboy da Meia-Noite” (Midnight Cowboy, 1969) e “O Homem da Maratona” (Marathon Man, 1976). Esse ambiente de paranóia, numa América em conflito de gerações, choques culturais, e feridas trazidas pela política externa, guerras como a do Vietname, e pelo abuso de drogas, são, como naqueles filmes, pano de fundo para “O Jogo do Falcão”.
O filme trata de uma história real, de dois jovens de famílias ricas e conservadoras, que chegaram a ser sacristães da paróquia local, antes de terem seguido caminhos diversos na adolescência. Christopher Boyce (Timothy Hutton) manteve sempre a aura bom moço, tendo acabado a trabalhar numa empresa (TRW na vida real, RTX no filme) de gestão de informações secretas de outras empresas, que a equipa deveria canalizar e destruir. Já Daulton Lee (Sean Penn) vivia no ócio de uma vida de consumo e tráfico de drogas.
Descontente com a situação internacional, e com a política dos Estados Unidos, Boyce decide que uma forma de agir é passar informações secretas para o Leste, pelo que pede a Lee que use as suas habituais viagens ao México para contactar a embaixada da União Soviética. Lee fá-lo, um tanto ou quanto desajeitadamente, mas consegue a atenção do agente a quem ele chama Alex (David Suchet). Estabelecem-se aí relações entre as duas partes, com Boyce a permanecer no anonimato, fornecendo documentação a Lee que a leva para o México. Só que do lado soviético a informação fica sempre além do desejado, e há a pressão de conhecer o verdadeiro fornecedor. Em breve Boyce percebe que Lee está viciado no dinheiro (e cada vez mais dependente de drogas) e que os soviéticos não o vão deixar parar. Tudo se conclui com um aprisionamento por parte das autoridades mexicanas, que deportam o duo para os Estados Unidos.
“O Jogo do Falcão” é uma história de espiões improváveis, jovens amadores, que apenas queriam fazer algum dinheiro, sem motivação política ou profissional. Ambos mostrados como provenientes de famílias conservadoras (o pai de Boyce, interpretado por Pat Hingle, é um ex-agente do FBI, e surge como um cliché do americanismo primário), representam o citado conflito de gerações, quando na sua não vêem as motivações dos seus pais, de uma América superior, garante de um modo de vida em que acreditem. Ao invés, desiludidos com actuações externas como o golpe no Chile (Boyce), ou simplesmente procurando a alienação nas drogas (Lee), não vêem qualquer problema de patriotismo na cedência de segredos de estado ao inimigo soviético.
Com um tema frontal da guerra fria, Schlesinger explora-o um pouco para lá do óbvio. Assim vemos de um lado o patriotismo exacerbado de quem vê na palavra “comunista” (os irmãos de Boyce são espancados na escola, com consentimento dos professores, e uma certa aceitação do próprio pai, só por lhes ser colado o rótulo de comunista, quando nem o são). Do outro lado, vemos os agentes soviéticos, longe de serem aterrorizadores. E claro, vemos os espiões como pessoas sem grande consciência do que estão a fazer. Tudo se torna quase um jogo que Schlesinger joga connosco, onde não há bons nem maus clássicos, e onde todos os valores previamente estabelecidos podem facilmente ser deitados por terra. É afinal esse o espírito dos tempos vividos no decorrer da história.
Com interpretações convincentes dos dois jovens protagonistas (juntos na tela pela segunda vez), Schlesinger consegue um filme sempre dinâmico, com o seu modo ácido de representar a sociedade norte-americana. Falha talvez alguma maior complexidade dos protagonistas, que encontramos já a meio do percurso, e com os quais não é fácil desenvolver uma grande empatia. Vale o crescimento da tensão, que provém de vermos os dois amigos cada vez com menor domínio na situação por eles criada, o que os leva também a entrarem em conflito um com o outro, num misto de ingenuidade e ambição deslocada.
Para o anedotário cinematográfico fica a transmissão do filme em 27 de Abril de 1986, quando alguém que se intitulou Captain Midnight interrompeu a transmissão por satélite da HBO para colocar uma mensagem sua. O filme ganhou uma publicidade inesperada graças a isso. O responsável, um empregado da Central Florida Teleport, chamado James MacDougall, fizera-o em protesto contra a política de subscrições de emissão por satélite.
Outro ponto publicitário a favor de “O Jogo do Falcão” foi o uso da música “This Is Not America” de David Bowie e o Pat Metheny Group.
Produção:
Título original: The Falcon and the Snowman; Produção: Hemdale Film; Produtor Executivo: John Daly; País: Reino Unido / EUA; Ano: 1967; Duração: 131 minutos; Distribuição: Orion Pictures; Estreia: 25 de Janeiro de 1985 (EUA), 5 de Agosto de 1985 (Portugal).
Equipa técnica:
Realização: John Schlesinger; Produção: Gabriel Katzka, John Schlesinger; Co-Produção: Edward Teets; Produtor Associado: Michael Childers; Argumento: Steven Zaillian [a partir do livro homónimo de Robert Lindsey]; Música: Pat Metheny, Lyle Mays; Fotografia: Allen Daviau [filmado em Panavision, cor por DeLuxe]; Montagem: Richard Marden; Design de Produção: James D. Bissell; Cenários: Linda DeScenna; Figurinos: Albert Wolsky; Caracterização: Ken Chase, Ester Oropeza (México); Efeitos Especiais: Jesus G. Duran; Direcção de Produção: Edward Teets, Luis Bekris (México).
Elenco:
Timothy Hutton (Christopher Boyce), Sean Penn (Daulton Lee), Richard Dysart (Dr. Lee), Pat Hingle (Mr. Charlie Boyce), Lori Singer (Lana), David Suchet (Alex), Dorian Harewood (Gene), Chris Makepeace (David Lee), Macon McCalman (Larry Rogers), Joyce Van Patten (Mrs. Boyce), Priscilla Pointer (Mrs. Lee), Nicholas Pryor (Eddie), Sam Ingraffia (Kenny Kahn), Mady Kaplan (Laurie), Boris Leskin (Mikhael), Daniel McDonald (Clay), Marvin J. McIntyre (Ike), Jennifer Runyon (Carole), George C. Grant (Karpov).