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2001: A Space OdysseySinopse:

Depois de vermos como, num passado distante, um monólito negro extraterreste foi fundamental para o salto que levou algumas espécies primatas a evoluir, em 2001, um monólito idêntico é descoberto na Lua. Quando o estranho objecto é exposto ao sol, emite um sinal na direcção de Júpiter, levando a que o Dr. Heywood Floyd (William Sylvester) coordene uma missão tripulada àquele planeta. Esta missão é tripulada pelos astronautas Dave Bowman (Keir Dullea) e Frank Poole (Gary Lockwood), que têm como companheiro, o computador HAL 9000 (voz de Douglas Rain). Só que em breve Dave e Frank percebem que HAL parece ter prioridades que eles desconhecem.

Análise:

Em 1968 Stanley Kubrick entrava para a galeria dos realizadores mais famosos de Hollywood, apresentando-nos um dos filmes mais grandiosos, controversos e enigmáticos da história do cinema: “2001: Odisseia no Espaço”. Escrito a meias com Arthur C. Clarke, a partir do conto deste “The Sentinel”, o filme foi uma revolução a diversos níveis, não só no campo da ficção científica, mas de todo o cinema, continuando hoje ainda a influenciar autores e espectadores como poucos filmes fazem, constituindo-se uma referência incontornável.

Arthur C. Clarke, um dos mais conceituados autores de ficção científica do século XX, e co-argumentista do filme, era um autor conhecido pela minúcia que colocava na explicação dos conceitos da Física que estavam por trás daquilo que se podia observar. Eram geralmente conceitos simples, não observáveis no nosso dia a dia, que se tornavam centro dos acontecimentos por ele descritos, e que marcavam o rumo dos eventos. São exemplo as plataformas giratórias, que por intermédio da força centrífuga criam uma gravidade artificial no espaço inter-planetário, ou o facto de no vácuo não existir som. Um e outro fenómeno estão proeminentemente presentes em 2001, dando-lhe desde logo uma aura de realismo, que nenhum outro filme do género jamais conseguiu (nem procurou) alcançar. Diz-se que os astronautras da Apolo 11, na sua missão lunar um ano depois (1969) disseram a propósito de várias coisas que viram/fizeram “isto é como no 2001”, tal o realismo que Arthur C. Clarke colocou nos detalhes da sua obra.

Como manda a regra da boa ficção científica, Arthur C. Clarke e Stanley Kubrick lançam-nos diversas questões pertinentes: existirá vida fora da Terra? Terá ela um papel na nossa origem e futuro? Como reagiremos nós quando confrontados com algo que nos transcende? Teremos capacidade de compreender a realidade? E finalmente, quais os limites da chamada inteligência artificial?

Mas se “2001: Odisseia no Espaço” é um marco no cinema de ficção científica, pelo rigor, beleza fotográfica e uso de efeitos especiais (numa altura em que ficção científica era sinónimo de série B, com más histórias de ataques de monstros e improváveis mutações genéticas), o filme é muito mais que isso. A visão ímpar de Stanley Kubrick soube construir sobre a obra de Clarke, mantendo os elementos chave da ciência, e elevando-a a um plano de diferentes questões metafísicas. Onde Clarke nos espanta com ideias descritas na narrativa e eventos, Kubrick faz uso do reino do visual, para nos desafiar com imagens, deixando os diálogos (note-se como são longas as sequências sem palavras) e a acção para um papel secundário.

Quase como se desse voz ao conceito da relatividade dos referenciais, Kubrick relembra-nos visualmente que no universo nenhum referencial é mais importante que os outros, e o que é cima para uns, é baixo para outros. Esse conceito parece fundamental para o seu modo de filmar, com planos que constantemente nos desafiam os preconceitos, e sequências que dão a 2001 uma coreografia de movimentos única, que fazem dele, em muitos momentos, um documentário visualmente exuberante e belíssimo do que são os movimentos no espaço inter-planetário.

A esse constante jogo de planos e movimentos, alia-se a conjugação da cor. O branco como lugar familiar (a nave, a casa na sequência final), o vermelho nos momentos de tensão (o fato espacial, o olho de HAL, o desligar da memória de HAL), o negro como enigma (o espaço, o monólito), e tanto mais que fica sempre por descobrir, numa estética tão única. Por fim há que destacar a música, desde o gentil “Danúbio Azul” de Johann Strauss II, ao imponente “Also sprach Zarathustra” de Richard Strauss, culminando na perturbadora música de György Ligeti.

Tematicamente a história lida com conceitos como a evolução humana, o possível papel de inteligência extra-terrestre, e a inteligência artificial. Pelas suas elipses (a mais famosa dada pelo atirar de um osso que ao passar a nave espacial, nos mostra um salto de 4 milhões de anos) e paralelismos (note-se as duas reacções à descoberta do monólito separadas desses mesmos 4 milhões de anos), e pela forma como o protagonista tem um olhar sobre a existência humana, fechando um ciclo que o transforma em bebé, temos uma contemplação sobre a evolução humana, o papel do homem do universo, e o seu confronto com outras formas de vida (extra-terrestre e artificial).

Só que, nesse caminhar humano (literal e simbólico), os obstáculos e saltos são tanto físicos como metafísicos, ficando sempre a ideia de que se alguma coisa aprendemos é que, por mais que evoluamos, muito mais fica por aprender. Por isso o filme é uma história de metáforas que nos trazem perguntas e não respostas.

Poucos filmes geraram tantos ícones, senão vejamos: o primata a brandir um osso como arma; o monólito negro como enigma; as naves a dançar no espaço a ritmo de valsa; a música imponente de Richard Strauss como o despertar da humanidade (com nítidas associações à obra de Nietzsche, que inspira Strauss); o olho vermelho e a voz de HAL, talvez a menos emocional voz ouvida no cinema; o bebé-estrela flutuando no espaço.

Para sempre misteriosa fica também a sequência final, contraste absoluto da inicial que mostra a madrugada do homem. Na final, através de inovadoras técnicas fotográficas, a viagem de Dave Bowman, transcende espaço e tempo como o conhecemos, tornando-se uma alucinogénica viagem para os sentidos. O seu resultado é uma série de associações surreais, que conduzem à transformação que produz a enigmática criança-estrela final.

De negativo fica apenas, talvez, o amargo de já termos passado o ano 2001, e as proporções épicas do filme ainda não se terem concretizado.

Produção:

Título original: 2001: A Space Odissey; Produção: Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) / Stanley Kubrick Productions; País: EUA/Reino Unido; Ano: 1968; Duração: 160 minutos; Distribuição: Metro-Goldwyn-Mayer (MGM); Estreia: 2 de Abril de 1968 (EUA), 1 de Outubro de 1968 (Portugal).

Equipa técnica:

Realização: Stanley Kubrick; Produção: Stanley Kubrick; Argumento: Stanley Kubrick, Arthur C. Clarke [baseado no conto “The Sentinel” de Arthur C. Clarke]; Música: Johann Strauss II, Richard Strauss, György Ligeti; Fotografia: Geoffrey Unsworth [filmado em Panavision, cor por Technicolor]; Design de Produção: Ernest Archer, Harry Lange, Anthony Masters; Direcção Artística: John Hoesli; Cenários: Robert Cartwright [não creditado]; Montagem: Ray Lovejoy; Figurinos: Hardy Amies; Caracterização: Stuart Freeborn.

Elenco:

Keir Dullea (Dave Bowman), Gary Lockwood (Frank Poole), William Sylvester (Dr. Heywood R. Floyd), Daniel Richter (Sentinela de Lua), Leonard Rossiter (Dr. Andrei Smyslov), Margaret Tyzack (Elena), Robert Beatty (Dr. Ralph Halvorsen), Sean Sullivan (Dr. Bill Michaels), Douglas Rain (voz de HAL 9000), Frank Miller (Mission Controller (voice), Bill Weston (Astronauta), Ed Bishop (Capitão do Shuttle Lunar), Glenn Beck (Astronauta), Alan Gifford (Pai de Poole), Ann Gillis (Mãe de Poole).

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